domingo, 17 de outubro de 2010

O TAPETINHO VERMELHO

            Uma pobre mulher morava em uma humilde casinha com sua neta muito doente.
            Como não tinha dinheiro sequer para levá-la a um médico, e vendo que, apesar de seus muitos cuidados e remédios com ervas, a pobre criança piorava a cada dia, resolveu iniciar a caminhada de 2 horas até a cidade próxima em busca de ajuda.
            Chegando no único hospital público da região foi aconselhada a voltar para casa e trazer a neta junto, para que esta fosse examinada.
            Quando ia voltando, já desesperada por saber que sua neta não conseguia sequer levantar da cama, a senhora passou em frente a uma Igreja e como tinha muita fé em Deus, apesar de nunca ter entrado
em uma Igreja, resolveu pedir ajuda.
            Ao entrar, encontrou algumas senhoras ajoelhadas no chão fazendo orações. As senhoras receberam a visitante e, após se inteirarem da história, a convidaram para se ajoelhar e orar pela criança.
            Após quase uma hora de fervorosas orações e pedidos de intercessão ao Pai, as senhoras já iam se levantando quando a mulher lhes disse:
            -- Eu também gostaria de fazer uma oração
            Vendo que se tratava de uma mulher de pouca cultura, as senhoras retrucaram:
            -- Não é necessário, com nossas orações, com certeza sua neta irá melhorar.
            Ainda assim a senhora insistiu em orar, e começou:
            -- Deus, sou eu, olha, a minha neta está muito doente Deus, assim eu gostaria que você fosse lá curar ela. Deus, você pega uma caneta que eu vou dizer onde fica.
            As senhoras estranharam, mas continuaram ouvindo.
            -- Já está com a caneta Deus? Você vai seguindo o caminho daqui de volta para Belo Horizonte e quando passar o rio com a ponte você entra na segunda estradinha de barro. Não vai errar, tá?
            A esta altura as senhoras já estavam se esforçando para não rir, mas ela continuou:
            -- Seguindo mais uns 20 minutinhos tem uma vendinha. Entra na rua depois da mangueira que o meu barraquinho é o último da rua. Pode ir entrando que não tem cachorro.
            As senhoras começaram a se indignar com a situação...
            -- Olha Deus, a porta tá trancada mas a chave fica embaixo do tapetinho vermelho na entrada. O senhor pega a chave, entra e cura a minha netinha.
            Mas olha só Deus, por favor não esquece de colocar a chave de novo embaixo do tapetinho vermelho senão eu não consigo entrar quando chegar em casa...
            A esta altura as senhoras interromperam aquela ultrajante situação dizendo que não era assim que se deveria orar, mas que ela poderia ir pra casa sossegada pois elas eram pessoas de muita fé, e Deus, com certeza, iria ouvir as preces e curar a menina.
            A mulher foi pra casa um pouco desconsolada, mas ao entrar em sua casinha sua neta veio correndo lhe receber.
            -- Minha neta, você está de pé, como é possível?
            E a menina explicou:
            -- Eu ouvi um barulho na porta e pensei que era a senhora voltando, porém entrou em meu quarto um homem muito alto, com um vestido branco e mandou que eu levantasse. Não sei como, eu simplesmente levantei.
            E quase em prantos, a menina continuou:
            -- Depois ele sorriu, beijou minha testa e disse que tinha de ir embora, mas pediu que eu avisasse a senhora que ele ia deixar a chave embaixo do tapetinho vermelho...

O SONHO DA PRINCESA

             Esta é a história de uma princesinha muito corajosa. Mas antes de falar dela, vou apresentar-lhe seu pai, o rei.
            O rei era viúvo é tinha três filhas: Carolina, Vanessa  e Clara. Cada uma possuía um dom diferente.
            Carolina, a mais velha, tinha a pele dourada e os olhos cor de mel; seu dom era o do canto. Cantava como um pássaro. Todas as manhãs, ao acordar, ela presenteava seu pai com um pequeno recital, em que cantarolava e assoviava, lembrando as melodias entoadas pelos bem-te-vis, rouxinóis e pardais.
            Vanessa, a filha do meio, era loira e tinha os olhos azuis como o céu. Seu dom era o da culinária. Ela sabia fazer os docinhos mais delicados e deliciosos do mundo. Cajuzinho, brigadeiro, quindim, beijinho, cocadinha --- tudo em que punha a mão ficava macio e apetitoso.
            Os doces pareciam pequenas pedras preciosas e deliciavam o rei e as princesinhas a cada manhã.
            Clara, a mais nova tinha a pele branca e a face rosada e cabelos longos e vermelhos como o fogo. Eram tão brilhantes, os cabelos, que refletiam a luz e imaginavam tudo, como se espelhassem a alma das outras pessoas. Clara tinha um dom especial. Ele sentia o que as pessoas e tinha sonhos premonitores.  Tudo que sonhava se realizava.
            O que ainda não contei é que o rei, embora tivesse orgulho de suas filhas, era um homem muito rígido, Qualquer desvio era motivo de punição. Por isso, as três princesas cumpriam tudo aquilo que ele ordenava.
            Clara era a que mais sofria, pois todas as manhas o rei lhe perguntava sobre o que havia sonhado. Ele desejava saber de antemão o que aconteceria em seu reino. Para agradar ao pai e soberano, a menina obedecia sem pestanejar.
            Certo dia aconteceu uma verdadeira tragédia! Clara teve um sonho que iria mudar o destino de todos. E quando o rei lhe fez a pergunta de todos os dias, ela não teve saída a não ser contar a verdade...
            ---- Meu rei, eu sonhei que vivia num castelo maravilhoso e que todos os reis do mundo vinham beijar–me a mão, inclusive o senhor.                                       
            ---  Que está dizendo sua insolente? --- perguntou o pai furioso. --- Isso é um absurdo! Eu sou rei! Você é quem deve me beijar a mão! Estou indignado com seu atrevimento!!!
            O rei ficou mesmo uma fera. Furioso. Vermelho de raiva. Roxo de fúria. Não suportava ouvir que sua filha pudesse se tornar mais poderosa do que ele próprio. Sua arrogância era tão grande quanto seu reino; seu orgulho tornava-o cego, surdo, e mudo, e fazia congelar seu coração.
            --- Vou mandar cortar-lhe todo o cabelo. Depois, você será expulsa deste castelo. Quero que suma da minha frente, para e que nunca mais eu tenha de me lembrar dessas palavras absurdas!
            A princesinha ficou imensamente triste. Tão triste que se tornou a imagem da própria tristeza. Nada tinha a dizer em sua defesa. Não que tivesse do que se defender, pois seu único pecado tinha sido dizer a verdade. Clara só teve tempo de dar um abraço em suas irmãs antes de adentrar a floresta, acompanhada de um dos soldados de seu pai, que havia sido incumbido de lhe cortar a linda cabeleira mágica.
            O soldado, contudo, teve compaixão da menina. Ficou com tanta pena que resolveu desobedecer um pouquinho a ordem do rei: cortou apenas alguns cachos de seu cabelo e trançou-os com uma palha bem fininha que tirara de uma árvore da floresta. Colocou a trancinha num pequeno baú, cobriu-a com um tule branco e enviou-a para o rei.
            Naquela floresta enorme e escura, sozinha, a princesinha parecia um grão de areia. As árvores gigantes e copadas lhe davam arrepios. Longe do castelo pela primeira vez, Clara sentiu medo.
            De repente, entre as árvores como num passe de mágica, abriu-se uma grande porta que a convidava a entrar. Apesar de assombrada, a menina resolveu aceitar o convite.
            Assim que Clara entrou, lhe foi servido um delicioso jantar. Havia de tudo naquela mesa: peixe, água fresca, cajuada, doce de jenipapo. Assim que ela se sentou, surgiu à sua frente um belo rapaz, que lhe abriu um sorriso
            --- Faz muito tempo que observo você, Clara. Entre todas as moças de todos os reinos deste mundo, você é a mais bonita, a mais bondosa e a mais talentosa  Por isso, gostaria que se tornasse  minha esposa e companheira.
            Apesar de ter gostado do rapaz e das coisas que lhe dissera, Clara engasgou de susto.
            --- Mas eu nem o conheço! --- declarou a jovem, boquiaberta.
            Então o moço acrescentou:
            --- Você pode ficar hospedada neste castelo mágico. Assim, poderá me conhecer sem presa.
            Clara, que não tinha mesmo para onde ir,concordou.
            Um ano se passou. E com a convivência, Clara se apaixonou pelo rapaz, que era, na verdade, o rei mais poderoso dentre todos.
            --- Eles marcaram a data do casamento e convidaram os reis de todos os reinos, mesmos dos mais distantes, inclusive o pai de Clara, para compartilhar aquele emocionante acontecimento.
            Quando o rei a viu, mais bela do que nunca, com seus longos cabelos vermelhos espelhados de tanto brilho e a sua pele branquinha como o vestido da noiva que usava, começou a chorar de arrependimento. Na verdade sentia uma saudade imensa da filha.
            A princesa que sentia uma saudade igualmente grande e que compreendeu a fragilidade do pai, chegou pertinho do rei e declarou:
            --- Ah, meu pai, não sofra mais! Eu o perdôo por te me expulsado do castelo. O orgulho lhe cegou, mas eu não me deixei cegar pelo rancor.
            E, assim dizendo, deu-lhe um abraço bem apertado, fazendo as pazes com ele.